quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Circulo ingleses

Círculos Ingleses: Sinais... Euclidianos?


Círculos nas plantações: mensagens matemáticas? (Foto: Internet)

Gerald Stanley Hawkins faleceu em 26 de maio de 2003 enquanto pilotava aeromodelos rádio-controlados em sua fazenda em Massaschusetts, EUA, aos setenta e cinco anos de idade. Ele certamente não foi um cientista qualquer. Nascido na Inglaterra, formado em matemática e física, doutorou-se em rádio-astronomia sob instrução de Sir Bernard Lovell. Em 1954 se mudou para os Estados Unidos, onde realizou pesquisas nos observatórios Harvard-Smithsonian, foi chefe do departamento de astronomia da Universidade de Boston e deão da Dickson College em Pensilvânia, até sua aposentadoria em 1989. [1]

Hawkins se tornou famoso nos anos 60 quando estudou a formação neolítica de Stonehenge, na Inglaterra. Pioneiro, valeu-se de computadores para o cálculo de alinhamentos e defendeu que Stonehenge seria um calendário astronômico neolítico, desbancando as vagas e duvidosas idéias existentes então sobre o envolvimento de Druidas ou do mago Merlin (!). Seu trabalho, Stonehenge Decoded (Stonehenge Decodificado), foi publicado no periódico Nature em 1963 e então em um livro de mesmo nome em 1965. Hoje, mais de três décadas depois, grande parte dele foi revisado, mas Hawkins é considerado como um dos principais incentivadores da ciência então nascente da “arqueo-astronomia”.

Nos anos seguintes, o doutor ainda pesquisaria as linhas de Nazca, contudo sem grandes achados. No fim dos anos 80 se envolveria com o estudo dos círculos em plantações na Inglaterra, e suas descobertas sobre o tema serão o tema deste artigo. Em conjunto, são provavelmente o mais próximo que se chegou de evidenciar algo cientificamente intrigante por trás do fenômeno dos círculos ingleses.

Evidência Circular

O trabalho de Gerald Hawkins com os círculos ingleses começa através do livro Circular Evidence (Phanes Press, 1989) de Colin Andrews e Patrick Delgado, dois dos primeiros e então principais investigadores do tema. Hawkins realizou seus estudos em uma época em que os círculos ingleses ainda eram primariamente círculos e ingleses – hoje já incluem desenhos de rostos humanos e alienígenas, estando espalhados em diversas partes do mundo. [2]

O tema lhe chamou a atenção, e através do livro ele passou a analisar “estatisticamente” as medidas dos círculos, isto é, analisar razões e relações entre comprimentos, diâmetros, larguras ou áreas de certas partes de formações em cereais. Para sua surpresa, teria descoberto repetidas vezes entre tais medidas razões de números inteiros como 1, 9/8, 5/4, 4/3, 3/2... Podem parecer razões aleatórias, mas são nada menos que razões que constituem parte da escala diatônica justa. Esta é a escala por trás das notas musicais que conhecemos (Dó, Ré, Mi, Fá, Sol...), e segundo Hawkins indicava algo sobre a inteligência de seus autores. A chance de que tais razões surgissem fortuitamente, sempre segundo ele, era de 1 em 25.000. [3]

Como se não bastasse, tempos depois descobriu que alguns círculos seriam demonstrações geométricas de teoremas matemáticos. Teoremas são proposições a ser demonstradas, e o mais famoso deve ser o teorema de Pitágoras (“a soma dos quadrados dos catetos é igual ao quadrado de hipotenusa”). O teorema de Pitágoras é conhecido há milhares de anos e ensinado a praticamente toda pessoa alfabetizada, porém os teoremas indicados em alguns círculos seriam teoremas Euclidianos não tão conhecidos ao cidadão comum.

Tudo isso ainda culminaria quando Hawkins notou que os quatro teoremas indicados geometricamente nos círculos eram casos especiais de um quinto teorema geral, desconhecido até então. Em 1992 o problema foi exposto na revista Science News como um desafio aos 267.000 leitores, [4] mas ninguém deduziu o quinto teorema e sua demonstração.

Gerald Hawkins havia encontrado um “perfil intelectual” dos autores de círculos, e não parecia muito compatível com o de meros brincalhões como Douglas Bower e David Chorley, que pouco antes haviam sido anunciados como autores de boa parte dos círculos. [5] Hawkins escreveu a eles perguntando por que haviam se utilizado da escala diatônica, apenas para não receber resposta alguma. A pergunta que se faz é: se o “perfil intelectual” dos autores de círculos indicava um conhecimento da escala diatônica, teoremas euclidianos e indicações de teoremas desconhecidos, e não eram Doug e Dave, quem realmente estava por trás de tudo isto?

Aleatoriedade

O valor de 1/25.000 para a chance de que razões diatônicas surgissem aleatoriamente é impressionante. O certo é que os círculos ingleses não são tão aleatórios em seu desenho: na época em que o professor fez seu estudo, sempre envolviam círculos e semicírculos intercalados, geralmente em disposição de triângulos eqüiláteros e hexágonos, com alguma variação ocasional incluindo quadrados, pentágonos e outros polígonos regulares. O reaproveitamento de medidas como o raio do círculo principal é algo muito comum, o que gera justamente a profusão de triângulos eqüiláteros e hexágonos como base de desenhos, e há uma explicação muito simples para tal. É o reaproveitamento de uma corda usada para traçar o círculo principal. Dê um compasso para uma criança, e ela bem pode acabar reaproveitando uma mesma abertura diversas vezes, gerando desenhos muito similares.

Mais do que isso, é importante notar que Hawkins não encontrou apenas razões diatônicas. Segundo ele, encontrou repetidas vezes tais razões em 12 de 19 círculos com “medidas acuradas” do livro Circular Evidence. Mas mesmo entre estes 12 círculos com razões diatônicas, diversas proporções entre outras medidas equivaliam a razões não-diatônicas. Ou seja, o fato é que embora nem todos os círculos apresentassem razões diatônicas mesmo entre algumas de suas medidas, todos eles continham sim razões não-diatônicas!

Demonstração de teoremas (Cortesia do autor)

Pode parecer uma questão de ponto de vista, e de certa forma é. Mas avaliá-los reforça a constatação evidente de que os círculos ingleses não são completamente aleatórios, e o encontro de razões diatônicas entre algumas de suas medidas, e não em outras, não deve ser extraordinário por si mesmo. Curiosamente, o próprio professor Hawkins forneceria outra evidência disto nos próprios teoremas que encontrou nos círculos.

Teoremas
Quatro dos teoremas identificados são teoremas Euclidianos. O quinto – um teorema geral do qual os quatro primeiros teoremas podiam ser derivados – foi deduzido por Hawkins, sendo desconhecido até então. Os teoremas (figura 1) são:[6]

Teorema I
Sejam três círculos iguais que partilhem uma tangente comum e formem um triângulo eqüilátero. Se um círculo for traçado através do centro dos três círculos, a razão entre o diâmetro deste círculo e o diâmetro de cada círculo menor original é diatônica: 4/3.

Teorema II
Para um triângulo eqüilátero, a razão entre as áreas do círculo circunscrito (externo) e inscrito (interno) é 4:1 – que também pode ser considerada parte da escala diatônica. A área do anel entre os círculos é três vezes a do círculo inscrito.

Teorema III
Para um quadrado, a razão das áreas dos círculos circunscrito e inscrito é de 2:1, diatônica.

Teorema IV
Para um hexágono regular, a razão entre as áreas dos círculos circunscrito e inscrito é de 4:3, diatônica.

Teorema V
Os teoremas I a IV são casos especiais de um teorema geral envolvendo triângulos e vários círculos concêntricos tocando seus lados e vértices. Triângulos diferentes geram teoremas diferentes.

Como se vê, o que os quatro primeiros teoremas demonstram é justamente que determinadas construções simples envolvendo triângulos eqüiláteros, quadrados e hexágonos inevitavelmente devem envolver razões diatônicas!

Se parece estranho que o próprio Hawkins evidenciasse o ponto, isto provavelmente ocorre porque aqui está outra questão de ponto de vista. Para Hawkins, os teoremas eram intencionais e os círculos com razões diatônicas eram parte desta intenção oculta. Não bastava incluir razões diatônicas, elas seriam incluídas como parte de teoremas euclidianos indicados geometricamente e que tivessem razões diatônicas como conseqüência natural. As razões diatônicas não eram apenas conseqüência dos teoremas, os teoremas euclidianos expressavam razões diatônicas como resultado de algo intencional e inteligente. Mas até que ponto a intencionalidade e inteligência são claras?

Ladrilhos Pitagóricos

Ladrilhos (Cortesia do autor)

Para ilustrar até que ponto desenhos geométricos simples podem representar de forma não-intencional teoremas matemáticos, podemos voltar ao teorema mais conhecido, o de Pitágoras. Conta uma anedota [7] que Pitágoras teria deduzido seu teorema observando ladrilhos sendo colocados, ladrilhos parecidos com o da figura ao lado.

(Ladrilho 1) São apenas ladrilhos compostos de triângulos, mas bem se vê que são todos triângulos retos, e que compostos podem formar outros triângulos retos, como o destacado em amarelo. A área dos pequenos quadrados que podem ser formados a partir dos catetos deste triângulo retângulo (com oito triângulos) é igual à área do quadrado maior que pode ser formado pela hipotenusa. Pitágoras a seus pés. Ainda assim, ninguém diria que o responsável pelo ladrilho deve realmente conhecer o teorema de Pitágoras.

Se o ladrilho anterior pode ser uma demonstração geométrica involuntária do teorema de Pitágoras, também não é o único e nem o mais interessante. Confira o segundo (Ladrilho 2).

Enxergar o teorema de Pitágoras no segundo ladrilho é mais difícil, mas, não obstante, ele está ainda melhor demonstrado no Ladrilho 3.

O quadrado azul é o quadrado da hipotenusa do triângulo retângulo vermelho. Os quadrados verde e o roxo são os quadrados dos catetos, e pode-se ver que os reorganizando pode-se formar o quadrado azul. “A soma dos quadrados dos catetos é igual ao quadrado da hipotenusa”.

Ladrilhos insuspeitos podem ser provas belas do teorema de Pitágoras, mesmo que seus autores não tenham a menor intenção de construir pisos matemáticos. Da mesma forma, os autores de círculos ingleses que segundo Hawkins demonstram teoremas Euclidianos muito provavelmente não tinham idéia de que tais teoremas poderiam ser encontrados em suas obras. Apenas integraram triângulos, quadrados e hexágonos em desenhos geométricos simples, reaproveitando medidas.

Nos olhos de quem vê
À primeira vista o trabalho de Gerald Hawkins sobre os círculos pode parecer surpreendente. Teoremas Euclidianos, razões diatônicas, tudo apontando a um “perfil intelectual” razoavelmente sofisticado para os autores de círculos. No entanto, resulta que o perfil intelectual que Hawkins encontrou ao identificar teoremas em simples formações goemétricas de círculos ingleses foi o seu próprio perfil.

Nem mesmo os autores de tais círculos conheciam ou pensaram em integrar tais teoremas em suas obras, que nada mais eram que círculos com polígonos regulares simples. Foi Hawkins que, à semelhança da anedota sobre Pitágoras, demonstrou sua perspicácia ao ver teoremas insuspeitos em desenhos inocentes e sem significado intencional – como ladrilhos no chão. O perfil intelectual de Hawkins era sofisticado a ponto do professor descobrir um teorema euclidiano desconhecido a todos. Uma interpretação sóbria da evidência disponível sugere que o quinto teorema não indica a inteligência dos autores de círculos, mas sim a de Gerald Hawkins. Que, no entanto, não pôde resistir à tentação de descobrir um enigma – que em verdade ele mesmo criou.

Fonte:
Revista Vigilia
Henrique de Almeida Prado Lhamas Ferreira
Ufo-Net News

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